Retomando os trabalhos

Olá amigos!

Estou retomando agora as atividades desse blog, depois de um longo período de inércia, em que estive envolvido com a finalização da minha dissertação de mestrado e do projeto Linha do Tucum, no Juruá.

Agora, morando no Matutu desde abril, sinto-me impelido novamente a retomar as atividades nesse espaço virtual. O que trago para esse mês é uma republicação dos textos clássicos, introduzindo o leitor ao Bhagavad Gita e ao Yoga Sutra de Patanjali. Achei importante porque algumas pessoas que foram introduzidas na prática de Yoga comigo recentemente, precisarão desse material para começarem a se situar melhor no universo da Yoga.

A Nova publicação que trago é sobre dicas de alimentação e hábitos diários, importantes para quem vai começar uma prática mais sistemática. Para o mês de agosto, mês de Krishna, trarei para vocês arquivos de áudio especiais, com gravações feitas no templo de Goura Nitai em Teresópolis, no ano passado, durante o dia de Janmastami, ou advento do Senhor Krishna. Trarei também a programação do curso vivencial de Yoga que estamos preparando para ser realizado aqui no Matutu no mês de setembro. Fiquem ligados!

Abraço afetuoso a todos!

Namastê!

Alimentação e Hábitos Diários




" Ó Arjuna! A prática de ioga é impossível para qualquer pessoa que coma em demasia ou coma muito pouco, durma em demasia ou não durma o suficiente/ Para quem se alimenta, repousa e esforça-se de modo regulado, e que mantém horários regulados em medidas apropriadas, a prática de ioga torna-se gradualmente a fonte que dissipa todo sofrimento mundano." (Sri Gita, 6.17)


A instrução acima resume tudo o que é preciso dizer com relação aos hábitos diários do praticante. O progresso na prática de Yoga depende do ritmo das atividades diárias. O praticante deve procurar manter uma vida regulada, com horários bem definidos. Assim como o sono e a alimentação, a prática diária deve ser realizada em uma medida apropriada de modo que possibilite o progresso do praticante, porém sem sobrecarregar o seu organismo e sem comprometer os outros deveres diários.

Dicas para a prática diária

Sem ritmo, é muito difícil obter um progresso na prática de Yoga. O ideal é que a prática aconteça todos os dias, no mesmo local e horário. Ao esforço contínuo e regular dá-se o nome de Sadhana. O Sadhana é aquilo que cumprimos religiosamente todos os dias, como escovar o dente e lavar o rosto. Todo mundo possui esse Sadhana: acordar, lavar o rosto e escovar o dente. A prática de Yoga deve fazer parte do nosso Sadhana. Sem Sadhana não há Yoga.

Sem dúvida, o momento mais favorável do dia para a prática de Yoga é pela manhã, antes do desjejum. Trinta minutos de prática diária é um tempo razoável para quem tem um dia-a-dia movimentado. Por mais que a pessoa tenha muitos afazeres, nada impede que ela acorde trinta ou quarenta minutos mais cedo para dedicar-se à sua prática diária.

Para um bom Sadhana o praticante pode seguir o seguinte roteiro:

- acorda, se lava, troca a roupa, vestindo-se confortavelmente, arruma a cama e prepara o ambiente para a prática. É importante que o ambiente seja limpo, arejado e iluminado. Um ambiente apropriado é fundamental. O praticante deve eleger um canto da casa que seja limpo e organizado diariamente para a realização da prática. Um bom incenso e uma boa música podem ajudar a tornar o ambiente mais agradável para a prática. O praticante pode também estabelecer um altar na sua casa. Pode ser um cantinho, que seja limpo, onde coloca-se a foto do mestre espiritual ou de qualquer elemento que remeta o praticante à noção de sagrado, em frente do qual ele possa oferecer um incenso, fazer uma meditação ou ler um texto sagrado.

- tendo preparado o ambiente, o praticante pode esticar o seu tapete (é bom que a prática não seja realizada em contato direto com o chão) e dar início à sua prática que pode variar entre 30 minutos e uma hora. Dentro desse tempo o praticante pode incluir um trabalho de pranayama, uma pequena meditação, uma breve leitura de um texto sagrado, uma prática equilibrada de asanas e um pequeno relaxamento. À medida que o ritmo é empregado, é surpreendente como esse momentinho sagrado da prática torna-se uma fonte de saúde, equilíbrio e bem-estar no dia-a-dia do praticante.


Dicas de alimentação para o aproveitamento da prática diária

Sem dúvida, como dito acima, o progresso na prática de Yoga depende da qualidade da alimentação e do sono do praticante. O que se relaciona com horários regulados e medidas apropriadas.

Dessa forma, as três grandes dicas de alimentação são: estabelecer horários regulados para as refeições diárias, ter moderação na quantidade ingerida, não ficando nem além, nem aquém do necessário para a manutenção do corpo; e se atentar para a qualidade do alimento ingerido.

Dentre os alimentos considerados inapropriados para o praticante de Yoga o principal é a carne. Primeiramente porque fere o primeiro princípio do código de ética da Yoga que é Ahimsa, ou não violência. Alimentar-se do sangue e do sofrimento de outros animais leva a pessoa a um estado mental completamente incompatível com a prática de Yoga. Em segundo lugar, o consumo regular de carne, principalmente as carnes vermelhas, prejudica o bom funcionamento dos intestinos e ocasiona a deposição de diversas toxinas no organismo que, além dos distúrbios fisiológicos, causam o bloqueio de diversos canais energéticos, tornando a pessoa preguiçosa e enfadada para a prática de Yoga.

Recomenda-se uma dieta balanceada, livre de carnes, com reduzido consumo de açúcar, doces e refrigerantes e que combine, de forma comedida, a ingestão de frutas, legumes e leguminosas, cereais, verduras e laticínios. Optando-se sempre por alimentos frescos e orgânicos.

O consumo de bebidas alcoólicas, drogas farmacêuticas (salvo sob orientação médica), cigarro e entorpecentes também são considerados inadequados para o praticante de Yoga.

É importante deixar claro, contudo, que cabe ao praticante experimentar e observar os impactos dos diversos hábitos diários na sua prática de Yoga. As dicas brevemente apresentadas aqui têm o objetivo de oferecer alguma orientação ao praticante, porém é extremamente individual a forma como se dará o ajuste da conduta visando ao melhor aproveitamento da prática. O mais importante é estar perseverante na prática, procurando sempre aplicar a consciência em todos os atos praticados, inclusive naqueles que podem ser considerados desfavoráveis à prática de Yoga.


Bhagavad Gita





O Bhagavad Gita foi escrito perto de 3.000 (a.c). Nasceu da conversa sagrada entre Sri Krishna e o guerreiro Arjuna no campo de batalha de Kuruksetra (região do centro-norte da Ìndia). Gita significa canção e Bhagavad refere-se à forma original e pessoal de Deus. Bhagavad Gita dessa forma traduz-se por “Canção do Senhor”. É talvez a escritura mais antiga e a mais lida em toda a história da humanidade. Os ensinamentos nele contidos, se estudados sob o abrigo de um mestre espiritual genuíno, são capazes de orientar o praticante de Yoga em seu processo de auto realização e satisfação interior.


Conforme apresentação de Sua Divina graça Srila Shridhar Dev-Goswami Maharaj em seu texto de apresentação do Gita: “O Sri Gita é ativação para o preguiçoso, coragem para o covarde, esperança para o desesperado e vida nova para quem está morrendo. O Sri Gita unifica e sustenta todas as posições, seja do revolucionário, do ocultista, do otimista, do renunciante, do liberacionista ou do teísta pleno. As concepções essenciais de todos os tipos de filósofos são abordadas dentro de uma lógica clara e vigorosa – seja a do ateu dotado da mais grosseira visão, seja a do santo mais elevado. O trabalhador fruitivo, o erudito, o praticante de ioga e o devoto do Senhor, todos encontrarão aqui uma apresentação compreensível e iluminante da substância de suas respectivas filosofias, e é por isso que o livro é muito apreciado por todos.”

O contexto histórico em que se dá o diálogo entre Krishna e Arjuna no campo de batalha é retratado no Mahabharata, texto épico indiano que narra a luta dos 5 filhos do rei Pandu (entre eles Arjuna), conhecidos como os Pândavas, contra as atrocidades de Duryodhana, seu perverso primo, que, tomado por um ciúme incontrolável, almejara durante toda a sua vida tomar o reino de Pandu e colocar os Pândavas em completa ruína.

Todas as injustiças e humilhações impostas aos Pândavas pelos Kauravas (Duryodhana e seus irmãos), resultam em uma grande guerra mundial que envolve praticamente todas as forças bélicas existentes no planeta na época (cerca de 3.000 a.c).

Antes do início da grande batalha, no campo de Kurukshetra, onde reuniam-se para a guerra 64 milhões de pessoas, o célebre guerreiro Arjuna, líder de um dos exércitos, pede a Sri Krsna, para manobrar sua quadriga de forma que ele pudesse observar o exército oponente: “ Nesse momento, ó rei, Dhananjaya (Arjuna), montado em sua carruagem decorada com a bandeira de Hanuman, estava pronto para disparar suas armas. Ao ver Duryodhana e sua companhia posicionados para o combate, Arjuna tomou o seu arco e dirigiu-se a Krsna: ó Krsna! Por favor, situe a quadriga entre os exércitos, para que eu possa observar os guerreiros contra os quais deverei combater nesta batalha e que vieram lutar para a satisfação do perverso Duryodhana. (Sri Gita 1.20,21)
Quando se depara, no campo inimigo, com diversos parentes, amigos, mestres e bem-querentes, o invencível guerreiro cai prostrado no meio do campo de batalha, completamente tomado pela dúvida e por um profundo sentimento de lamentação. Queixa-se então a Krishna, enfatizando o despropósito daquela guerra, declarando por fim: “Govinda eu não lutarei” (Sri Gita 2.9). “Arjuna disse: ó Krsna! Vendo meus parentes diante de mim ansiosos pela guerra, esvai-se a força dos meus membros do meu corpo e sinto minha boca ressecar/ Meu corpo inteiro treme e arrepia-se. Não tenho mais firmeza para segurar meu arco Gandiva e mina pele queima./ Ó Kesava! Não posso me conter por mais tempo. Minha mente está desorientada, e vejo apenas sinais hostis carregados de mau agouro/ Sequer vejo algum bem em matar meus próprios parentes na batalha. Ò Krsna! Não desejo vitória,reino ou felicidade/ Ó Govinda! Qual o valor do nosso reino? Qual o propósito da felicidade e do desfrute, se aqueles para quem desejaríamos tudo isso – mestres, patriarcas, filhos, avós, tios maternos, sogros, netos, cunhados, e outros parentes – vieram hoje para a guerra, decididos a sacrificar suas próprias vidas e posses? Portanto, ó Madhusudana, não desejo matá-los mesmo que queiram tirar-me a vida.” (Sri Gita, 1.28-34)

De forma surpreendente, Krishna, seu quadrigário, amigo e conselheiro, o aconselha a abandonar a covardia e se levantar para a batalha: Ó filho de Kunti! Abandone essa covardia, pois ela é indigna de você. Ó grande herói, livre-se dessa fraqueza de coração e levante-se para a luta! (Sri Gita, 2.6). Dessa forma Krishna inicia sua ampla e elaborada resposta a Arjuna, revelando-se ao longo do diálogo como o Supremo Senhor, Mestre Espiritual de todo o universo.

No início de sua resposta, Krishna começa enfatizando a natureza da alma e mostrando o caráter transitório do mundo material e o caráter permanente do mundo espiritual, conforme se segue: O Senhor disse: Ó Arjuna, usando palavras sábias, você se lamenta pelo que não é digno de pesar. Pois aquele que é sábio não se lamenta pelos vivos, nem pelos mortos/ Nunca houve um tempo em que inexistíssemos, Eu, você, ou todos esses reis. Assim como existimos no presente, também já existimos no passado, e continuaremos a existir no futuro/ Tal como o ser vivo corporificado passa gradualmente neste corpo da infância à juventude e à velhice; do mesmo modo, a alma obtém ainda outro corpo ao advir a morte. Os sábios não se confundem com tal transformação/ Ó filho de Kunti! Somente a ocupação dos sentidos com seus objetos ocasiona as sensações de frio, calor, prazer e dor. Porém, esses efeitos são temporários – aparecem e desaparecem. Portanto, ó Bharata, você deverá tolerá-los.

Dessa forma, ao longo de sua exposição, Krishna sintetiza de forma brilhante toda a herança legada pela cultura védica ao longo de eras ancestrais, e estabelece, de forma definitiva, os princípios filosóficos de todas as formas de Yoga existentes.

Um dos pontos culminantes da narração acontece no capítulo 11 denominado Visva-rupa-darsana: A Visão da Forma Universal, quando Arjuna declarando a dissolução completa de sua ignorância em relação à natureza suprema de Krishna, manifesta o desejo ainda de ver, de fato, a Sua forma onipotente. “Ó senhor de todos os poderes místicos! Imploro que, por favor, exiba sua forma onipotente e imperecível, se Você entender que sou capaz de contemplá-la”. Krishna exibe então Sua forma universal para o atônito Arjuna que “com seu corpo tremendo em êxtase” dá início à impressionante descrição que se segue: “Arjuna disse: Ó Senhor dotado de uma forma magnífica! Em seu corpo, sou capaz de ver os semideuses, todas as espécies de vida, os sábios e as serpentes transcendentais, e ainda Mahadeva e o Senhor Brahma sentado sobre a flor de lótus. Ó Senhor do Universo! Ó forma universal! Em todas as direções vejo Seu corpo ilimitado de muitos braços, barrigas, olhos e faces – entretanto, não posso vislumbrar Seu começo, meio ou fim. Resplandecendo por todas parte com coroas, maças de combate, e armas em forma de disco, vejo sua imagem todo-iluminada e refulgente, irradiando como o sol e o fogo flamejante e, portanto, muito difícil de contemplar além de toda a imaginação. Você é a personificação da Verdade Absoluta Suprema, cognoscível por meio dos Vedas; Você é o reservatório exclusivo deste universo e o preservador imperecível da eterna religião mencionada nos Vedas. Você é certamente a eterna Personalidade Suprema, e essa é minha firme convicção. Sem começo, meio ou fim, ilimitadamente poderoso e possuidor de inúmeras armas, com olhos como o sol e a lua e a compleição como a do fogo incandescente, vejo Você cauterizando o universo com Sua intensa radiação. Nada além de você preenche todas as direções e todos os espaços entre o céu e a terra. Ó forma universal! Ao ver este seu perfil estarrecedor e aterrador, todos os residentes dos três mundos estão amedrontados. Todos os semideuses estão entrando em Você, alguns com temor, oferecendo-Lhe orações com as mãos em prece. Os grandes sábios e seres perfeitos estão lhe oferecendo orações selectas, repletas de adoração e dizendo: ‘Que toda auspiciosidade recaia sobre o universo’. Os semideuses conhecidos como Rudra, Aditya, Vasu, Sadhya, Visvadeva, os Gêmeos Asvini-Kumara, as deidades dos ancestrais, as raças Gandharva, Yaksa, Asura e Siddha contemplam Você; na verdade todos observam Você maravilhados. Você é a origem eterna de todos os semideuses e o único refúgio do universo. Você é o único conhecedor e cognoscível e a corporificação da transcendência. Ó ilimitado! Este universo é penetrado por Você.” (Sri Gita, 11.15-22,38)

Após isso, o inigualável quadrigário de Arjuna ainda dá importantes instruções sobre o conhecimento espiritual e revela o mais oculto de todos os tesouros que é o próprio afeto e estima que Ele tem por Arjuna. “Ouça mais uma vez o Meu ensinamento supremo e o mais oculto de todos os tesouros. Você Me é muito querido, e é realmente por isso que Eu revelo este Meu supremo ensinamento para seu verdadeiro benefício. Krishna deixa claro então que o verdadeiro conhecimento espiritual só pode ser obtido por meio do afeto e da devoção que a alma cultiva em relação a Deus e ao mestre espiritual, que é a única forma de despertar a boa vontade do Absoluto em favor de suas partículas infinitesimais .

No final do texto Krishna ainda instrui Arjuna a abandonar todas as formas de religião e se entregar tão somente a Ele: “abandonando todos os tipos de religião, entregue-se apenas a Mim. Eu o libertarei de todos os tipos de pecado. Portanto não se desespere”. (Sri Gita, 18.66).

Por fim o grande guerreiro Arjuna se apruma, recobrando suas forças e declara: “Ó infalível! Por Sua graça, minha ilusão foi dissipada. Posso agora recobrar minha identidade, todas as minhas dúvidas se foram e permaneço rendido a Você. Agora seguirei Sua ordem (Sri Gita, 18.73). Arjuna se levanta então para a batalha - que dura dezoito dias - na qual praticamente toda a força bélica existente no planeta é aniquilada. Os Pândavas, a quem Krishna se dispôs a proteger pessoalmente, foram um dos poucos sobreviventes dessa assombrosa guerra.

O sábio Sanjay, narrador do Gita, declara no último verso do texto: Onde quer que se encontrem o Senhor Supremo de todos os poderes místicos, o próprio Senhor Sri Krishna, e o arqueiro conquistador de opulências, o próprio Arjuna, ali mesmo prevalecerá a deusa da boa fortuna, a deusa da vitória e a virtude suprema. Decerto esta é minha firme conclusão. (Sri Gita, 18.78)



O Gita então é matéria indispensável de estudo para todo praticante de Yoga e para todo aquele que se dedica ao auto-conhecimento e à auto-realização.

Textos Clássicos

Yoga Sutra de Patanjali

O Yoga Sutra foi escrito por volta do ano 360 d.c pelo sábio Patanjali que codificou
o sistema védico de Yoga, reunindo-o em uma escritura bastante técnica. Alguns estudiosos consideram o Yoga Sutra como um verdadeiro tratado de psicologia. A obra constitui-se de 195 versos organizados em quatro capítulos: Samadhipada, que trata da definição de Yoga e dos estados mentais característicos em Yoga e em não-Yoga; Sadhanapada, que trata da prática de Yoga, Vibhutipada que trata dos benefícios e dos riscos advindos da prática de Yoga e Kaivalyapada, que trata do processo de emancipação final alcançado através da Yoga.

Na primeira parte, o Yoga Sutra começa definindo Yoga: Yoga é a habilidade de voltar a mente exclusivamente em direção a um objeto e sustentar essa direção sem quaisquer distrações (Yoga Sutra 1.3). Dessa forma, enquanto a mente se mantém nesse estado de Yoga, a pessoa tem condição de ter uma percepção direta e verdadeira do objeto de sua meditação. Fora do estado de Yoga a habilidade de compreender o objeto é simplesmente substituída pela concepção mental desse objeto ou por uma total falta de compreensão. (Yoga Sutra 1.4)

Os cinco vrttis, ou atividades mentais que devem ser controladas para que o praticante se mantenha em Yoga são: compreensão correta, compreensão errônea, imaginação, sono profundo e memória. (Yoga Sutra 1.6). De acordo com o comentário dado pelo professor Desikachar , o predomínio e os efeitos de cada uma delas sobre o nosso comportamento e atitudes combinam-se para formar nossa personalidade.

O estado de Yoga, de acordo com o Yoga Sutra, só pode ser conseguido por meio da prática constante e do desapego. Essa prática deve ser seguida por um longo tempo, sem interrupções e com as qualidades de uma atitude positiva e entusiasmo, para que se obtenha o sucesso desejado (Yoga Sutra 1.12-14). Além disso, o Yoga Sutra destaca que o estado de Yoga também pode ser alcançado oferecendo orações regularmente a Deus com um sentimento de submissão ao seu poder (1.23). Deus é definido na escritura como o Ser Supremo cujas ações nunca se baseiam em compreensão errônea, que conhece tudo que há para ser conhecido, que é eterno, o professor definitivo, sendo a fonte de orientação para todos os professores (Yoga Sutra 1.24-27).

Dessa forma, com fé, prática constante, desapego e orações a Deus, a pessoa pode evitar os Klesas, ou obstáculos que surgem naturalmente ao longo da prática de Yoga. São eles: doença, estagnação mental, dúvida, falta de prudência, fadiga, excesso de complacência, ilusões sobre o seu próprio estado mental, falta de perseverança e retrocesso. Todos esses obstáculos acabam por causar alguns dos seguintes sintomas: desconforto mental, pensamento negativo, incapacidade de sentir-se confortável em diferentes posturas do corpo e dificuldade de controlar a própria respiração (Yoga Sutra, 1.30,31).

Na segunda parte da obra, o Yoga Sutra apresenta o Ashtanga Yoga, ou os oito componentes que perpassam o desenvolvimento da prática de Yoga (2.29):

1. Yama – atitudes para com o meio ambiente
2. Nyama – atitudes para conosco
3. Asanas – prática dos exercícios físicos
4. Pranayama – prática de exercícios respiratórios
5. Pratyahara – prática do controle dos sentidos: “Quando o praticante de ioga não está mais viciado nos desfrutáveis objetos dos sentidos do som, textura, forma sabor e odor; quando não está mais apegado a nenhuma ação buscando desfrutá-las, e tendo atingido a mais completa renúncia de todos os planos de tal ação, apenas então poderá ser aclamado como sendo aquele que verdadeiramente atingiu a ioga”. (Sri Gita, 6.4)
6. Dharana – prática da concentração mental: “Pela mente controlada por Dharana, deve-se completamente estabelecer a mente na alma. Então, pela prática gradual, removendo a mente dos objetos externos, deve-se atuar no transe do Samadhi e não pensar, nem por um segundo, em nada além da alma.” (Sri Gita, 6.27)
7. Dhyana – prática de meditação: “Ó heróico Arjuna! Sem dúvida a mente é intável e extremamente difícil de controlar. Entretanto, ó filho de Kunti, a mesma é subjugada pela prática contínua da meditação iogue na Superalma, como ensinada pelo mestre espiritual fidedigno, e pelo abandono do desfrute mundano dos sentido.” (Sri Gita, 6.37)
8. Samadhi – cultivo do estado de Yoga de completa união com a natureza do Ser Individual (atma) e o Ser Supremo (paramatma): “O estado de perfeito Samadhi, ou transe, é aquele em que a mente disciplinada do iogue obtém o desapego – até mesmo do mais leve pensamento de conotação mundana. O iogue permanece satisfeito apenas no Senhor. Tendo vivenciado a Superalma diretamente por meio de seu coração purificado, experimenta aquela felicidade eterna, perceptível pela divina inteligência da alma e destituída do contato com os sentidos e com os objetos dos sentidos – e nunca se desvia da natureza intrínseca da alma. (Sri Gita, 6.20-22)

Os Yamas e os Nyamas são considerados a base que sustenta a prática de Yoga. O Yoga Sutra estabelece cinco Yamas e cinco Nyamas, a saber:

Os cinco Yamas:
1. Ahimsa: não violência, consideração por todos os seres vivos, especialmente os que são inocentes, os que estão em dificuldade ou em situação pior do que a nossa .
2. Satya: veracidade, honestidade, boa conduta.
3. Asteya: ausência de cobiça por algo que não lhe pertence.
4. Brahmacharya: castidade ou auto-controle.
5. Aparigraha: ausência de apego por posses e prestígio.

Os cinco Nyamas:

1. Saucha: limpeza, pureza, asseio.
2. Santosha: contentamento.
3. Tapas: austeridade, prática constante.
4. Svadhyaya: prática constante de auto investigação e estudo de textos sagrados.
5. Ísvara-pranidhana: prestar reverências ao Supremo Senhor.

A prática atenciosa dos três últimos Nyamas constitui-se no processo conhecido como Kriya Yoga, e por si só leva o praticante a observar os demais Yamas e Nyamas e atingir os mais elevados estágios da prática de Yoga.